"Sem suspeitar da tua precária superioridade, mais de uma vez você me atirou um desdenhoso "velho" na cara. Nunca te disse, te digo porém agora: me causa enjôo a juventude, me causa muito enjôo a tua juventude, será que preciso fazer um trejeito com a boca pra te dar a idéia clara do que estou dizendo? É bastante tranqüilo este depoimento, é sossegado, ao fazê-lo, me acredite, Paula, não me doem os cotovelos. Está muito certa aquela tua amiga frenética quando te diz que sou "incapaz de curtir gentes maravilhosas". Sou incapaz mesmo, não gosto de "gentes maravilhosas", não gosto de gente, para abreviar minhas preferências."
Raduan Nassar em "O Ventre Seco"
Há dois ou três anos disseram-me que o Raduan Nassar era um dos maiores escritores vivos de língua portuguesa. A pessoa que mo disse não tinha grande gosto literário e por isso menosprezei a sua opinião. Pensei que a sua importância era exacerbada pelo facto do gajo ter escrito dois romances, meia dúzia de contos e ter desaparecido para cuidar de galinhas (literalmente). Fiz mal, muito mal.
Este ano, na Feira do Livro, tive oportunidade de folhear os seus dois romances e de ficar com vontade de ler mais. Sem saber muito bem como, acabei por me esquecer dos comprar. Esta semana colmatei essa falha comprando o livro de contos "Menina a Caminho". São apenas cinco contos e são todos bons. São todos obras-primas.
Mandei uma mensagem a um amigo dizendo que "Hoje de Madrugada" é, hoje, o melhor conto de sempre. Só depois li "O ventre seco". São os dois geniais. E os outros também são. São tão bons que eu fiquei abananado sem dar conta. São fodidos e eu não sei explicar porquê. Deram-me um nó no estômago e eu, leitor avisado, não compreendi como ele fez isso. Macacos me mordam se não meto mão ao resto nos próximos tempos.
