Das recordações em concertos
Eu tinha dez anos. Ela veio de Angola e foi morar para perto da casa do meu melhor amigo. Era magra, muito alta e já tinha maminhas. Eu apaixonei-me por ela, o meu melhor amigo também. Não éramos rivais porque tínhamos um objectivo comum: queríamos que viesse brincar para a rua connosco. Os pais não deixavam, com receio do novo país. Ela ficava na varanda a ver-nos brincar e nós fazíamos palhaçadas para que risse. Um dia acenou e nós improvisámos uma serenata. Cantámos “Menina Estás à Janela”. Ela estava com um sorriso lindo. Nunca a tínhamos visto tão feliz.
Devagarinho, com muita paciência, convencemos os pais a deixá-la vir brincar connosco. Ela contava-nos histórias de Angola e dizia que lá as meninas não podiam namorar e que os pais lhe bateriam se beijasse um de nós. Nunca nos beijou, mas deu-me a mão e eu fiquei muito feliz. No ano seguinte mudei de casa e nunca mais a vi.
Ontem fui ver o Vitorino ao Coliseu e quando ele cantou a “Menina Estás à Janela” lembrei-me dela e quase me emocionei. Foram tempos bonitos aqueles.